Comemora-se este ano os 120 anos do nascimento de Alfredo Marceneiro - 1891 - 1982
Como já explicitei quer em livros quer nos blogues, Alfredo Rodrigo Duarte, vulgo Alfredo Marceneiro, na realidade nasceu em 1888, a 29 de Fevereiro, mas só foi registado em 1891, este facto deveu-se a dificuldades financeiras de seus pais ( facto muito comum na época), e quando tiveram a oportunidade de o baptizar, corria o ano de 1891, como não era um ano bissexto, portanto não havia 29 dias, optaram pelo dia 25 de Fevereiro.
A Editora Ovação e a FNAC, decidiram lancar um produto alusivo à efeméride, e convidaram-me a incluir no mesmo um pequeno livro sobre o meu avô, em conjunto com o DVD - Alfredo Maceneiró - Três Gerações de Fado, e o CD - Marceneiro...É só Fado.
Propus dar ao "produto" o título ALFREDO MARCENEIO "O Patriarca do Fado", o que foi aceite, achei que teria de explicar o porquê do epíteto no inicio do livro e que passo a trancrever:
ALFREDO MARCENEIRO
“PATRIARCA DO FADO”
Raro será o português que se não tenha interrogado acerca do fascínio que o Fado exerce sobre si. Verifica-se que o mesmo acontece com os muitos estrangeiros de diversas partes do mundo, com culturas, etnias e credos diferentes dos nossos, que ao assistirem a essa entrega sublime do cantador que nos transmite para além da sonoridade da voz, da expressão facial, do gesticular do corpo, uma melopeia acompanhada por uma parelha de músicos “guitarras e violas”, que nos provoca nostalgia, amor, ódio, ciúme, alegria, que provoca o ritmo acelerado do coração, enquanto na alma desabrocham sentimentos, que extravasam as barreiras linguísticas, e as almas irmanam-se.
O Fado está cheio de símbolos. Os símbolos são gerados pelo povo, sejam políticos ou militares, sejam sábios ou médicos, sejam músicos ou cantores. É o povo o grande juiz: eleva os ídolos quando lhe agradam, os venera quando tal merecem; Mas também é o mesmo povo que os ignora quando são falsos.
No universo da expressão musical, o Fado é um mundo dentro de outro mundo, é um universo de cantigas onde cabem, a dor, a saudade, o entusiasmo, a fé, a esperança... O Fado é uma “seita” com os seus ritos, os seus segredos…
Será talvez uma afirmação sacrílega esta de vos dar como título a este livro:
Alfredo Marceneiro – Patriarca do Fado.
Na “Catedral do Fado” há um sentir que nos leva muitas vezes à lágrima, tal qual “água benta”, como a que tocamos, na saudação de respeito, que nos motiva ao cruzar os umbrais de uma outra qualquer "Catedral"; também no Fado, há um ritual, um estado de alma... que veneramos e respeitamos.
Se alguém entendeu todo este ritual foi decerto Alfredo Duarte, o Marceneiro, por ofício.
Se os prosélitos do Fado entenderem perpetuar a sua bandeira - O Fado genuíno - , que seja relembrando a sua obra, a sua dádiva ao Fado. Alfredo Marceneiro nunca seapelidou, nem deixou que o apelidassem, Rei do Fado, mas foi, sem sombra de dúvidas, o seu mais louvado príncipe, tão igual ao Povo que com ele se confundiu amavelmente.
Alfredo tu foste/és o “ Patriarca do Fado
Amália com esta frase lapidar, demonstrou a sua veneração por ele:
Alfredo... tu és o Fado
ATENÇÃO
Há videos em algumas páginas deste blogue que ao "clicar para reproduzir" recebe a mensagem indicando que o vídeo foi retirado pelo utilizador.
Acontece que inexplicavelmente todos os meus vídeos que eu tinha no Youtube foram apagados!!!.
Não sei o que se passou, pois ultimamente também têem acontecido alguns problemas na minha página no Facebook.
Haja o que houver eu não desisto... não tenho a certeza do que aconteceu, mas se foi aquilo que eu desconfio, podem crer eu não desisto
Estou a tentar recuperar esta falha, mas parece que a solução será voltar a reenviá-los, o que levará alguns dias.
Deste facto apresento as minhas desculpas.
Vítor Marceneiro
Geração de Marceneiro também canta Fado
Alfredo Duarte Júnior e seu filho Vítor Duarte cantam a dueto, A Lucinda Camareira
Este video foi retirado de uma entrevista conduzida por Joaquim Letria ma RTP1, em 1991, ano em que se comemorou o centenário do nascimento de Alfredo Marceneiro. (Ano do seu registo, pois na realidade nasceu a 29 de Fevereiro de 1888)
Convento de Mafra
FADISTA VITOR DUARTE MARCENEIRO NO «DISTO É QUE EU GOSTO»
Vítor Duarte Marceneiro, neto do popular fadista Alfredo Marceneiro, é o convidado da edição 1003, do programa «Disto é que eu Gosto», dia 19 de Fevereiro, às 9 Horas da manhã, este é programa realizado pelo distinto radialista Rogério Batalha.
Ver mais em: http://distoequeeugosto.blogspot.com
Sobre Vítor Duarte
Aos Sábados, com apenas 10 anos, Vítor Marceneiro, já acompanhava o avô ou o pai, Alfredo Duarte Júnior, aos espaços fadistas em Alfama ou Bairro Alto. Só aos 20 anos, este filho do Bairro de Alcântara, cantou pela primeira vez em público.
Teve ainda uma curta experiência no Restaurante Típico Luso ao lado de Tristão da Silva, Augusta Ermida e Plínio Sérgio, tendo gravado, com o avô e o pai, para duas discográficas.
Em 1995 editou o seu primeiro livro «Marceneiro - Três Gerações de Fado». Foi produtor de várias gravações fonográficas quer do avô quer do pai. Realizou várias conferências sobre temas e figuras fadistas, com destaque para o seu avô, bem como Hermínia Silva, Berta Cardoso e Manuel de Almeida entre outros.
Actualmente está empenhado em colocar Lisboa no Guiness Book como « a cidade mais cantada no mundo».
Em 2008 foi galardoado pela Fundação Amália Rodrigues com o prémio ENSAIO/DIVULGAÇÃO.
A partir das 9 horas será divulgado o seu trabalho discográfico com o título genérico «GERAÇÃO MARCENEIRO -FADOS COM TRADIÇÃO» e, também, um «DUETO DOS MARCENEIROS AVÔ & NETO».
Quem quiser conversar com o neto de Alfredo Marceneiro poderá utilizar os telefones do estúdio da
Rádio do Concelho de Mafra – 105.6 FM e em Emissão ONLINE
Telefones 261 817 205 e 261 817 206.
Vai fazer 4 anos foi apresentado no Museu do Fado, o DVD – Alfredo Marceneiro – Três Gerações de Fado.
Como estava na mesa, o meu filho filmou algumas partes da cerimónia, decidi na altura não o publicar, achei que poderia ser considerado pretensioso da minha parte.
Decidi montá-lo e apresentá-lo agora, porque na sequência da efeméride da comemoração dos 120º aniversário de meu avô, em que há uma edição a que dei o título de ALFREDO MARCENEIRO – O Patriarca do Fado.
O Museu do Fado ignora esta efeméride! Será que Alfredo Marceneiro não merecia um simples comunicado sobre o facto?
E os outros? Como a “memória é curta”….
O vídeo fala por si, acho que lhe poderia dar o título " Como se passa de BESTIAL a BESTA"
Pobres de espírito, a história nem que passe muitos anos, os julgará… ou não, porque quando perderem o apoio, passado meses já ninguém se lembra de vós, porque as vossas acções, com a capa de defensores do Fado e das suas tradições é elitista, o povo simples e amante do Fado, os intervenientes do Fado, que não os do “Lobbie”, estão a “leste” das vossas acções, mas não sou eu só que o digo, ouvi há dias uma reportagem da Antena 1, que o demonstrou.
O Fado agora é só para intelectuais…
“Os símbolos são gerados pelo povo, sejam políticos ou militares, sejam sábios ou médicos, sejam músicos ou cantores. É o povo o grande juiz: eleva os ídolos quando lhe agradam, os venera quando tal merecem; Mas também é o mesmo povo que os ignora quando são falsos.”
Enviado em comentário a esta página por Paulo Conde, bisneto e biógrafo do grande poeta Carlos Conde, tomo a liberdade de o transcrever, com o destaque que merece:
O FADO É DO POVO
O fado é bem do povo - e muito seu
O povo é que é juiz e há-de julgar,
Quem pensa ter chegado ao apogeu
Sem nunca ser capaz de lá chegar!...
O fado não punia dessa gente
Que o critica de mais em vários lados,
Nem pode consentir impunemente
Uma corja imbecil de mascarados!
O fado não precisa de elogios
Daqueles que não pretendem dar nas vistas,
Nem pode tolerar que haja vadios
Disfarçados com nome de fadistas...
O fado não precisa, que hora-a-hora,
O seu nome imortal ande na liça,
Nem pode ser a capa salvadora
Dalguns que devam contas à justiça!
No fado, felizmente, inda há fadistas,
Por isso tenho esp'rança, tenho fé,
Do público escolher os seus artistas
E o resto ser corrido a pontapé!...
Prosa de Carlos Conde
Nota: Para falar acerca do meu avô, fui convidado para uma entrevista conduzida por Júlio Isidro para a RTP-Memória, e para a Antena 1 e RDP- Internacional, com Edgar Canelas.
Álvaro Marciano da Silveira (Álvaro Ilhéu), nasceu no Funchal em 1883.
Aprendeu no Funchal a arte de construtor de violinos com Augusto M. da Costa.
Vem para Lisboa e continua a construir violinos bem como alaúdes especialmente para Inglaterra, mas foi como guitarreiro que adquiriu fama de nomeada, guitarristas de mérito foram seus clientes, Armandinho, Salgado do Carmo, Júlio Silva, Jaime Santos e outros.
Jaime Santos afirmou: — Álvaro da Silveira é o construtor de guitarras que mais conhece da sua arte em Portugal, trata-se quanto a mim, do único que resta da «velha guarda», considero ainda que quase a fazer os noventa anos é o “Stradivarius” português
ENTREVISTA
Álvaro da Silveira: duas mãos que falam mais do que a boca, duas mãos expressivas que acariciam mansamente as cordas da guitarra. É de tarde e, lá fora, pelos, vidros da janela fechada, vejo que cai uma chuva miudinha, triste. Neste segundo andar de um beco desconhecido, porém, a tristeza não se estampou ainda nem nas coisas nem nas pessoas. Os olhos de Álvaro da Silveira, com oitenta e cinco anos a pesar-lhes em cima, são vivos como os de um jovem:
— Sinto-me completamente bem e é muito raro pôr os óculos. O médico dá,..me, ainda, quinze a vinte anos de vida.
É bom ouvir falar assim uma pessoa, naquela idade em que o comum dos mortais já perdeu a esperança. Mas Álvaro da Silveira trá-la consigo, aquece-se à sua chama, vive dela:
De Verão, levanto-me às cinco, seis horas da madrugada e pego imediatamente no trabalho, que dura todo o dia, porque nunca me falta. Agora, com o frio, só saio da cama lá para as oito.
Mas quem é Álvaro da Silveira? Nascido no Funchal há 85 anos, dedica-se à actividade de construtor de guitarras e violas desde os onze anos. Foi ainda na sua terra natal que se iniciou na profissão, às ordens do mestre Augusto da Costa (que se especializara em Itália). Mas aos vinte e poucos já se
encontrava em Lisboa: era encarregado de uma oficina na Rua da Boavista (a Casa Artur de Albuquerque, hoje designada Santos & Silva Vieira, Lda., onde, na altura, apenas se construíam instrumentos musicais).
É, hoje, um simpático ancião de cabelos brancos e convívio agradável.
OFICINA PRÓPRIA E LOJA DE VENDAS
— Saí de lá por minha livre vontade. Eu queria trabalhar, por minha conta e consegui-o. Tive, depois, uma oficina e uma loja de vendas no Bairro Alto, na Travessa dos Inglesinhos. Mas há quase treze
anos que estou nesta casa, onde, praticamente, nem tenho espaço para me virar. Vocé sabe: as rendas caras, a vida difícil, a mulher doente.
Perguntamos-lhe se lembra de alguns nomes famosos para quem tenha trabalhado. Seus olhos adquirem um brilho invulgar, não isento de serenidade, e parecem perscrutar o passado:
— Todos os grandes mestres espanhóis de viola me deram a honra de ser meus clientes: Cano, que morreu há já cinquenta e oito anos e chegou a tocar para os reis D. Luís e D. Carlos; Rabel, que era um excelente professor; Sainz, etc. Dos guitarristas portugueses, recordo um em especial: Júlio Silva, que foi o maior de todos. Mas lembro também Carmo Dias, Salgado do Carmo, eu sei lá…
— As guitarras que constrói são de modelo vulgar ou têm alguma característica própria?
— O meu modelo é exclusivo, porque ninguém ainda o conseguiu imitar. Tenho o meu segredo. Uma guitarra custa, hoje em dia, à volta de três contos. (A esposa, que assiste à conversa, interrompe: «Eles bem desmancham os instrumentos que ele faz para descobrirem o segredo. Mas é impossível: foi ele próprio que fabricou as ferramentas com que os constrói»).
Álvaro da Silveira olha a rua lá fora, onde passam os eléctricos e onde um sol, hesitante ainda, põe um brilho estranho nas coisas. Olha a rua como quem olha a vida, como quem surpreende (ou procura descobrir) o futuro. O futuro? Sim, o futuro, apesar das suas palavras repassadas de uma serena angústia:
— Um dia destes, talvez, vou à procura do Asilo e dizem-me que não há vaga. E levei uma vida inteira a trabalhar...
— E nas horas vagas o que faz?
— Nas horas vagas? Olhe, eu não tenho horas vagas. Só aos domingos, no Verão, é que dou uns passeios: Vou nas excursões por esse País fora, mas só um dia de cada vez. Os clientes não me deixam mais. Gosto do ar dos campos, de respirar de pulmões abertos. Só não conheço o Algarve e uma parte do Minho. Mas hei-de lá ir qualquer dia...
RECORDAÇÕES E OPINIÕES
— Em tempos dei lições de guitarra. Afino toda a espécie de instrumentos de corda, mas construi-los é a minha paixão. A indústria perdeu importância, nos últimos tempos. Não há quem trabalhe nisto, só curiosos. As canções também não ajudam — são muito más, em geral. Há ainda as guitarras eléctricas, que não produzem música, produzem ruído. Aqui há cinquenta anos, as oficinas não, queriam receber aprendizes; hoje é o que se vê: não há oficiais. Mas fazer um instrumento é fácil: qualquer caixote, com um buraco e cordas, pode tocar. O difícil é fazer bons instrumentos.
— Trabalha sozinho?
— Podia ter dois ou três homens por minha conta, porque o trabalho que há dava para lhes pagar. Mas não tenho espaço nem existe quem saiba trabalhar (e sobretudo quem queira aprender). Dos construtores do meu tempo apenas eu ainda vivo.
Vem a propósito falar do Fado. Saber de um homem com quase um século o que pensa do fado dos nossos dias:
— Não me servem os fados modernos, que soo meias-canções. O fado castiço, o velho Fado, são poucos os intérpretes que ainda o cultivam: a grande Hermínia, Maria Teresa de Noronha...
— E Amália?
— Gosto também, mas Amália, além do Fado, canta outras coisas que nada têm a ver com o Fado!
A chuva recomeçou lá fora. Álvaro da Silveira está emocionado (os olhos líquidos, pois então...), e o repórter despede-se. Não sem, antes, fazer uma promessa:
— Daqui a quinze anos cá estarei, quando o senhor fizer os cem, para o entrevistar outra vez.
In: Revista TV – 1968
Fotos de: Coelho da Silva
Texto de: Torquato da Luz
Etiqueta que Álvaro da Silveira colocava
nos instrumentos musicais que constuia