Lisboa foi desde sempre uma cidade de mercadores.
Pelas ruas vendia-se um pouco de tudo. Com os cestos às costas ou a mercadoria no chão o mais pequeno espaço servia para o negócio. Com os descobrimentos este pendor mercantilista acentuou-se.
As naus traziam para o porto de Lisboa todo o tipo de produtos provenientes dos mais exóticos e longínquos recantos, assim no séc. XVI começou a haver a preocupação de arrumar a cidade e colocar os mercadores em locais específicos.
Foi então que surgiu o Mercado da Ribeira Velha. Ficava situado na zona do actual Campo das Cebolas, vendiam-se principalmente bens de primeira necessidade como hortaliças, peixe e fruta.
Em 1766, passados onze anos depois do terramoto que martirizou a cidade de Lisboa, o mercado foi transferido para ocidente do Terreiro do Paço (o local onde se encontra actualmente). Uma transferência inserida no plano de expansão da cidade traçado pelo Marquês de Pombal.
Começou a funcionar em 1771 e foi chamado de Mercado da Ribeira Nova, não era um mercado como hoje os concebemos, era composto por 132 telheiros e cabanas com 256 bancas de venda, passava de um aglomerado minimamente organizado de comerciantes onde se continuava a vender de tudo.
Foi só no séc. XIX, mais concretamente em 1882 que abriram as portas do refeito Mercado da Ribeira Nova. O nome manteve-se mas desapareceram os telheiros e as cabanas. No mesmo espaço nasceu um edifício com uma estrutura em ferro que albergava no interior todas as bancas. A grande novidade era a existência de um corredor central onde o vendedores dispunham de água em abundância, o que permitia expor e conservar as mercadorias com cuidados de higiene inexistentes até então, sendo o projecto da autoria do engenheiro Ressano Garcia e foi aprovado em sessão camarária em 17 de Junho de 1876.
Passado onze anos da inauguração um gigantesco incêndio destruiu quase por completo o já por duas vezes inaugurado Mercado da Ribeira Nova. A nova reconstrução demorou quase 30 anos, de 1902 a 1930, ano em que aparece então a cúpula que (ainda hoje existe). Uma cúpula que suscitou a curiosidade dos Lisboetas, pouco habituados a um mercado a funcionar num edifício deste género. O espanto foi tal que passaram a chamar-lhe a "Mesquita do nabo".
Foi então em 1930 e desta vez definitivamente que o Mercado da Ribeira ganhou a configuração preservada até hoje. A ele ficará para sempre ligado o nome de Frederico Ressano Garcia, com 27 anos o jovem engenheiro venceu um concurso para entrar nos quadros da Câmara Municipal de Lisboa, Dos quatro concorrentes para as duas vagas abertas, Ressano Garcia conseguiu o primeiro lugar e assume o cargo de engenheiro do Município no ano de 1874.
O novo edifício já era muito mais que quatro paredes e oito portões para albergar vendedores. Os cuidados estéticos estiveram presentes no projecto, como é bem visível nos painéis de azulejos que ornamentam o átrio da entrada principal e o primeiro piso. No segundo andar começa a área restrita do mercado, é através de uma escada de pedra em caracol, que se chega á sala redonda com o piso em madeira e decorada com riquíssimos frescos assinados por Gabriel Constanti e datados de 1930.
O segundo andar serve como espécie de convite para se subir mais uns lances de escada, desta vez em ferro, que dão acesso ao local onde está religiosamente guardada uma das mais emblemáticas peças do edifício, o relógio da torre.
Fabricado em França na empresa "Horloges Bodet" era considerado um relógio revolucionário para a época. Mas a importância do relógio não impediu que a máquina estivesse parada quase 20 anos. Só em 1998 a Câmara Municipal de Lisboa decidiu contratar um dos mais prestigiados relojoeiros portugueses, António Franco para inspeccionar o relógio da torre. Em menos de um ano o sistema mecânico foi totalmente restaurado e o mostrador teve de ser feito de novo.
Um mostrador que guarda a assinatura do homem que permitiu que os cacilheiros voltassem a guiar-se pelo relógio da Torre do Mercado "FRANCO-LISBOA".
Outra escada em caracol conduz ao ponto mais alto do mercado. O piso onde está instalado o sino que dá as badaladas às horas e meias horas. Daqui pode observar-se toda a imponência do Tejo e ver atracar os cacilheiros que os ponteiros do relógio voltaram a guiar.
Mais tarde falarei do célebre “cacau da ribeira” onde ao raiar do dia começava a azáfama dos vendedores, e o inicio dos “moinantes” irem para casa.
Que saudades.
Amália Rodrigues
canta Namorico da Rita
de Artur Ribeiro e António Mestre