O jovem Alfredo fazia questão de andar sempre muito bem vestido, de fato, camisa muito bem engomada com o laço ao pescoço e calçando polainites de polimento. Desse seu aspecto elegante nasceu a alcunha de «Alfredo-Lulu» — Lulu era equivalente ao «Janota» dos dias de hoje. (Como se pode observar nas fotos inseridas)
Em meados de 1920, um grupo de fadistas decide organizar no recinto Clube Montanha, uma Festa de Homenagem a dois nomes grandes do fado de então: Alfredo Correeiro e José Bacalhau.
O poeta Manuel Soares, responsável pela organização do evento, não prescindiu de convidar Alfredo para fazer parte dele
No dia em que juntamente com o guitarrista José Marques, estavam a ultimar os detalhes para a composição dos cartazes de promoção da festa, chegaram à conclusão de que ambos desconheciam o apelido do Alfredo. Como acharam que «Lulu», como então ele era alcunhado, não seria o mais apropriado, decidiram por bem mandar imprimir os cartazes, anunciando em destaque "Alfredo MARCENEIRO", visto que esta era a sua profissão.
Os seguidores do Fado, que nunca perdiam a oportunidade de comparecerem a estes espectáculos, sentiram grande curiosidade em saber quem era aquele Alfredo Marceneiro, de quem nunca tinham ouvido falar e que tinha merecido tamanha evidência!
Assim não foi de admirar que rapidamente a lotação se tivesse esgotado.
Alfredo cantou, pondo tal ênfase na sua actuação, que no final foram para ele todas as honras da noite. Dos comentários a esse espectáculo saiu extraordinariamente prestigiado o seu nome.
" O MARCENEIRO"
Letra de Aramando Neves
Mísica: Casimiro Ramos
Com lídima expressão e voz sentida
Hei-de cumprir no Mundo a minha sorte
Alfredo Marceneiro toda a vida
Para cantar o fado até à morte.
Orgulho-me de ser em toda a parte
Português e fadista verdadeiro,
Eu que me chamo Alfredo, mas Duarte
Sou para toda a gente o Marceneiro.
Este apelido em mim, que pouco valho,
Da minha honestidade é forte indício.
Sou Marceneiro, sim, porque trabalho,
Marceneiro no fado e no ofício.
Ao fado consagrei a vida inteira
E há muito, por direito de conquista.
Sou fadista, mas à minha maneira,
À maneira melhor de ser fadista.
E se alguém duvidar crave uma espada
Sem dó numa guitarra para crer,
A alma da guitarra mutilada
Dentro da minha alma há-de gemer.
E foi assim que o Alfredo «Lulu» passou a ser para todos e, para sempre, conhecido por ALFREDO MARCENEIRO.
Mais tarde, o poeta Armando Neves escreveu um poema que lhe dedicou, ao qual deu o título: "O Marceneiro".
Estes versos com música de sua própria autoria foram o "seu Cartão de Visita", e passaram a ser tema obrigatório nas suas actuações.
Assim principiou a carreira de Alfredo Marceneiro, precisamente na altura em que o fado, saído dos cafés iluminados a gás (onde se ouvia ao piano, na voz de camareiras e faias), começava a impor-se no mundo do espectáculo. Ouvir então cantar a chamada canção nacional que, no entanto havia de manter-se nos retiros «fora de portas» e na garganta dos participantes das cegadas, em dias do Carnaval lisboeta, já não era uma perigosa aventura. É a partir daí que o fado, na sua forma estilizada, irá chegar ao teatro ligeiro e, mais tarde, ao cinema. Por outro lado, poetas como José Régio, Augusto Gil, António Botto ou Silva Tavares, encontram no próprio fado, inspiração para muitos dos seus versos. Aparecem novas vozes e, em breve, o fado passa a mostrar-se ao mundo, com foros de atracção internacional.
© Vítor Duarte Marceneiro in “Recordar Alfredo Marceneiro”
Alfredo Marceneiro
Canta: Cartão de visita "O Marceneiro"