Quando minha mãe faleceu tinha eu de 5 para 6 anos, e fui morar com os meus avós paternos, a avó Judite e o avô Alfredo. O meu avô acompanhou a minha mãe na fase da doença e tinha um carinho muito especial por ela, era como uma filha para ele e para a minha avó. Como é de calcular no início da mudança, eu era uma criança com momentos de muita tristeza e melancolia, mas meu avô acarinhava-me muito, e acima de tudo fazia diálogos comigo, o que se prolongou até à minha saída de casa, foram estes diálogos e o meu espirito de curiosidade, que contribuiram para que eu possa nestas páginas, contar com fidelidade o que me ensinou e relatou sobre a vida, e a sua experiência no Fado. Num certo dia eu estava taciturno e lembro-me do meu avô logo que se apercebeu, começou por me dizer:
— Oh! Vitó, nas estejas com esse olhar mortiço, tens os olhos da tua mãe, que eram muito bonitos. Nunca mais me esqueci, pois logo de seguida disse-me estes versos:
Tua mãe quando nasceste Viu cair duas estrelas Foi apanhá-las, e fez-te Teus lindos olhos com com elas
Há uns anos atrás, contei com emoção este episódio ao poeta Carlos Escobar, que glosou a quadra, que eu nunca soube se foi inspiração do meu avô, ou era alguma quadra de um autor que ele tinha em mente.
AS ESTRELAS DO MEU MENINO
TUA MÃE QUANDO NASCESTE
VIU CAIR DUAS ESTRELAS
FOI APANHÁ-LAS, E FEZ-TE
TEUS LINDOS OLHOS COM ELAS
QUEM O DISSE JÁ PARTIU
DISSE-O COM AR MENINEIRO
E QUANDO O DISSE ELEGEU
DESCENDÊNCIA... MARCENEIRO
INDA MUITO PEQUENINO
O PETIZ NÃO PERCEBEU
MAS SOUBE LOGO MENINO
QUE HAVIA ESTRELAS NO CÉU
REPAROU NUMA, BRILHANDO
E O AVÔ TAMBÉM OLHOU
E DE MÃOS DADAS ANDANDO
SORRIU, PENSOU E CALOU
E NÃO DISSE AO SEU MENINO
QUE NAS ESTRELAS ALÉM
NUM PONTINHO PEQUENINO
ESTAVAM OS OLHOS D' MÃE
Autoria de Carlos Escobar para o Vitor Duarte
Foto de minha mãe Mariete Duarte Vitor Duarte aos 18 meses