Fernanda Maria canta
Saudade, vai-te embora
de Júlio de Sousa
Fernanda Maria, voz nostálgica, impregnada de sentimento, de saudade de tragédia e nostalgia, voz que chega aos nossos corações, pois é também uma voz bem timbrada que nos atrai e seduz, é uma mulher com garra e convicções, é bem uma “Castiça Cantadeira de Fados” qualidades que infelizmente vem sendo difícil de encontrar, porque a Alma de Cantadeira de Fados, não é um exercício nem uma aprendizagem, é um dom que Deus dá, a alguns.
Fernanda Maria por Cralos Conde
Quando a Fernanda Maria
Canta o que sabe cantar,
Pôe na voz toda a magia
Que o fado tem p´ra nos dar!
E ao coar pela garganta
Essa toada dolente,
Sabe sentir o que canta
Porque só canta o que sente!
P´la voz que a todos seduz
Tem o nome consagrado,
De uma estrela que reluz
No firmamento do Fado!
Falar de “coisas” simples, é difícil.
Falar de “sentimento” é complicado, e mesmo arriscado.
Diz a singular sabedoria “não é fadista quem quer / mas sim quem nasceu fadista”.
O que é isto de se “nascer” fadista? “Fadista” diz-se do intérprete de Fado que canta com “alma”, independentemente da sua origem territorial, sexo ou idade, quer seja profissional ou amador.
Sabemos quão peculiar é esta forma de canto e quanta “raça” se exige a um/uma intérprete até se lhe poder chamar, com orgulho bairrista - “Fadista de Raça”.
Sempre existiram grandes fadistas para todo o Fado. Creio mesmo que estariam sempre em consonância com as épocas e ambientes em que viveram. Desde Maria Cesária e Severa (primeira metade do século XIX) até aos nossos dias, muitos foram os nomes femininos e masculinos, nobres e plebeus, de vozes urbanas ou rústicas, vindos das grandes cidades do litoral ou do interior, das aldeias ou das ilhas, que arrebataram com os seus poemas eruditos ou populares, numa mensagem transcendente, a nossa alma Lusa e nómada.
Num popular Bairro de Lisboa, Mouraria – ali mesmo onde a tradição diz ter nascido o Fado – nasceu ela. Ela, Fernanda Maria !
Tudo o que se espera do Fado; tudo o que o Fado nos pode transmitir; tudo o que podemos definir como Fado, nasceu por destino na expressão involuntária e no arrebatamento emocional desta senhora-intérprete.
O “estilo” valoriza e define um/uma Fadista.
Cada intérprete “cria” (ou deveria criar, não imitar!) a sua forma de dizer e, aliando-a à palavra no contorno melódico da sua íntima expressão de sentir, ela dá-nos a justa medida da sua entrega. É neste momento que a “transfusão” se processa. É justamente por isso que quem escuta o Fado, mesmo sem saber o que dizem as palavras, sabe o que dizem os corações. O Fado é um Canto primordial ao Sentimento.
Acredito que o mesmo “sentir” que acompanhou a gesta portuguesa desde o alvor da nossa nacionalidade, com mais ou menos influências nos ritmos e nos cantos da nossa diáspora, continua presente.
Ninguém no mundo saberá melhor sentir ou descrever Saudade como num Fado um Português !. E ninguém ficará indiferente ao timbre, ao gesto, à emoção, à entrega, à luminosidade, à intenção, à musicalidade, à dicção e à presença de Fernanda Maria.
Maria de Lourdes De Carvalho