Poema AMAR
Canta e é autora da música
Teresa Silva Carvalho
Carta de Florbela Espanca a uma amiga
Vila Viçosa, Setembro 1916
JÚLIA
Agora, quero contar-te uma coisa que me enterneceu deveras, uma noite destas.
O luar caía límpido e claro como água, jorrando duma fonte perdida no infinito ...
Eram 24 horas ... eu sonhava! ... Nisto, uma voz ergueu-se, uma voz acariciadora, pungente na toada pungentíssima do fado tão querido à alma portuguesa, sabes o quê, minha Júlia? Essas minhas despretensiosas quadras que o Suplemento publicou, tão" pobres, tão ingénuas, tão sentidas, que o povo humilde as acolheu e as canta! como diz o nosso suave Augusto Gil. Até hoje nem um único elogio me comoveu assim.
Tenho-os ouvido vibrantes e enternecidos, lisonjeiros sempre, mas quase sempre amigos, e nunca, nunca como este tiveram o dom de me arrasar os olhos de águas.
Ficaram, desde esta noite profunda de luar) as minhas pobres quadras) sagradas para mim. Cantou-as a boca do povo, beijou-as a boca do povo, e é como se toda a alma rústica e humilde do meu Portugal beijasse com infinito amor a minha, nesses humildes versos, tão pobres… tão ingénuos ... tão sentidos!
Beija-te a tua
Florbela Espanca.
O FADO de Florbela Espanca
Corre a noite de manso, num murmúrio,
Abre a rosa bendita do luar,
Soluçam ais estranhos de guitarra,
Um gemido de amor anda no ar.
Há um repouso imenso em toda a terra,
Parece a própria noite a escutar
E o canto continua mais profundo
Que página sentida de Mozart!
E' o fado. A canção das violetas
Que foram almas tristes de poetas
P'ra quem a vida foi uma desgraça!
Minha doce canção dos deserdados,
Meu fado que alivias desgraçados
Bendita sejas tu, cheia de graça.