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Associação Cultural de Fado

"O Patriarca do Fado"
Sábado, 11 de Setembro de 2010

JOÃO VILLARET -actor e declamador

Nasceu em Lisboa a 10 de Maio de 1913.
Villaret dedicou-se ao teatro depois de terminar o liceu e durante os anos trinta e quarenta do século vinte, teve uma ascensão vertiginosa que o levou a triunfar nos palcos do teatro declamado e ligeiro e no cinema - onde assinou interpretações memoráveis em Três Espelhos, de 1947, e Frei Luís de Sousa, de 1950.
O seu amor pela poesia fez com que se viesse a tornar num dos recitadores mais extraordinários que Portugal conheceu.
O registo do seu recital no São Luiz, lançado em álbum, ainda hoje se mantém disponível.
Mas Villaret tinha também um especial apreço pela revista, onde se estreou em 1941 para escândalo daqueles que não gostavam de ver misturas. Em 1947, Aníbal Nazaré, António Porto e Nelson de Barros escrevem-lhe o Fado Falado, que criou na revista 'Tá Bem ou Não 'Tá?, verdadeira peça de antologia da história da música e do teatro popular portugueses. Um recitativo sobre uma melodia de Fado onde a letra, que jogava habilmente com a mitologia do género, era não cantada mas verdadeiramente "representada" por Villaret, que assim juntou ao cânone da música portuguesa mais um clássico. Outros êxitos, como A Vida é um Corridinho de 1952, ou a célebre Procissão de 1955, se lhe juntariam, mas o Fado Falado ficou marcante.
Nos anos 50, com o aparecimento da televisão, transpõe para este meio de comunicação a experiência que adquirira no palco, e também no cinema e programas radiofónicos. Aos domingos declamava na RTP com graça e paixão, poemas dos maiores autores nacionais
Ficaram célebres, entre outras, a sua interpretação como declamador dos poemas:

Procissão, de António Lopes Ribeiro (1955);
Cântico negro, de José Régio
O menino de sua mãe, de Fernando Pessoa
No cinema, Villaret surge em:
O Pai Tirano, de António Lopes Ribeiro (1941), numa breve aparição, como pedinte mudo;
Inês de Castro, de Leitão de Barros (1945), onde representa Martin, o bobo;
Camões, de Leitão de Barros (1946);
Três Espelhos, de Ladislao Vadja (1947), onde representa o inspector;
Frei Luís de Sousa, de António Lopes Ribeiro (1950), no papel de criado;
O Primo Basílio, de António Lopes Ribeiro (1959).
João Villaret faleceu a 21 de Janeiro de 1961, vítima de doença prolongada
Teve um irmão de seu nome Carlos Vilarett, que era pianista, e que o acompanhou muitas vezes em recitais. Carlos Vilarett, que eu cheguei a conhecer e ouvir tocar,era músico no “Dancing” Lua Nova, no Bairro Alto, mesmo ao lado do Luso, na Travessa da Queimada. Meu avô ia lá muitas vezes só para o ouvir, pois considerava-o um grande músico, e foi nessas idas que eu o conheci.
Consultas: Wikipédia, Vitor Pavão dos Santos, Biblioteca Nacional.
Apoio de Fernando Batista do Porto
  
 
João Villaret declama
Fado Falado
De: Aníbal Nazaré e Nelson de Barros
Video Clipe de " guilhas122"
 
   

 

 

Fado triste

Fado negro das vielas,

Onde a noite quando passa

Leva mais tempo a passar.

Ouve-se a voz,

Voz inspirada de uma raça

Que Mundo em fora

Nos levou pelo azul do mar.

Se o fado se canta e chora

Também se pode falar.

 

Mãos doloridas

Na guitarra

Que desgarra

Dor bizarra.

Mãos insofridas,

Mãos plangentes,

Mãos frementes,

Impacientes.

 

Mãos carinhosas,

De desejo,

Sequiosas como um beijo.

Mãos de pecado,

Mãos de fado

A guitarra a afagar

Como a um corpo de mulher

Pró despir e pró beijar.

 

Mas um dia, Santo Deus, ele não veio;

Ela espera olhando a Lua.

Meu Deus, que sofrer aquele!

O luar bate nas casas,

O luar bate na rua,

Mas não marca,

Mas não marca a sombra dele.

 

Procura-o como doida...

E, ao voltar de uma esquina,

Viu ele acompanhado,

Com outra ao lado,

De braço dado,

Gingão, feliz, rufião,

Um ar fadista e bizarro,

Um cravo atrás da orelha

E preso à boca vermelha

O que resta dum cigarro.

 

Lume e cinza na viela

Ela vê; que homem aquele!

O lume no peito dela,

A cinza no olhar dele.

 

E então...

O ciúme chegou,

Como lume queimou

O seu peito a sangrar. Foi

Como vento que veio

Labareda a atear,

O amor a aumentar.

 

 

Foi

A visão infernal,

A imagem do mal

Que no bairro surgiu.

Foi

Um amor que jurou,

Que jurou e mentiu.

 

Corre em vertigem, num grito,

Direita ao maldito

Que a há-de perder;

Puxa a navalha:

"Canalha,

Não há quem te valha,

Tu tens de morrer!"

 

Há alarido na viela!

Que mulher aquela,

Que paixão a sua!

E cai um corpo, sangrando,

Nas pedras da rua.

 

Mãos carinhosas,

Generosas,

Que não conhecem rancor;

Mãos que o fado

Compreendem,

E entendem

Sua dor.

 

Mãos que não mentem

Quando sentem

Outras mãos

Prà acarinhar;

Mãos que brigam,

Que castigam...

Mas que sabem perdoar!

 

E pouco a pouco

O amor regressou

Como lume queimou

Essa vida infeliz.

Foi um amor que voltou

E a desgraça tocou

Para ser mais feliz.

 

Foi uma luz renascida,

Um sonho, uma vida

De novo a surgir.

Foi um amor que voltou,

Que voltou a sorrir!

 

Há gargalhadas no ar

E o Sol a vibrar

Tem gritos de cor.

Há alegria na viela

E em cada janela

Renasce uma flor!

Veio o perdão, e depois,

Felizes os dois

Lá vão lado a lado...

 

E digam lá

Se pode ou não

Falar-se o Fado!

 

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Este trabalho está licenciado com uma Licença Creative Commons - Atribuição-NãoComercial-CompartilhaIgual 4.0 Internacional, assim como registo na Sociedade Portuguesa de Autores, sócio nº 125820, e Alfredo Marceneiro é registado como marca nacional no INIP, n.º 495150.
música: Fados Falado
Viva Lisboa: Grande Vulto da Cultura
publicado por Vítor Marceneiro às 03:00
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