Maria do Carmo (Alta) canta:
Cantadeira, nasceu em Moura em 1885 e faleceu em Lisboa em 1964. De nome completo Maria do Carmo Fontes Páscoa Bernardo, foi a elevada estatura que lhe proporcionou a alcunha que a celebrizou, imposta também para a distinguir da sua contemporânea Maria do Carmo Torres.
Filha de lavradores, deixou Moura com 3 anos e mudou-se para Lisboa com a família, onde foi aprendiza de camiseira na casa Ramiro Leão e mais tarde costureira com atelier próprio. Teófilo Braga, que habitava na residência frente à sua, estimulou-a a cantar canções populares.
Com apenas 11 anos, foi uma das primeiras fadistas a cantar em retiros fora de portas.
A partir de 1918 dedicou-se mais ao Fado, nunca abandonando a sua profissão. O prestígio como cantadeira ligado à sua personalidade organizada e empreendedora, levou-a a fundar o restaurante Ferro de Engomar que geriu em conjunto com Alberto Costa. Foi talvez o primeiro restaurante com elenco privativo, onde se cantava o Fado (às segundas, quintas e sábados) e onde acorriam figuras importantes de Lisboa.
Por vezes acompanhava-se à guitarra, instrumento que aprendera a tocar com um tio. Apresentou-se praticamente em todos os recintos de Fado de Lisboa (Águia Roxa, Caliça, Pedralvas, Nova Cintra, Magrinho, Manuel dos Passarinhos, Bacalhau, Perna de Pau, Quebra-Bilhas, Tia Elena, Montanha, Charquinho, José dos Pacatos), efectuando algumas digressões ao Brasil, nomeadamente em 1920, onde permaneceu dois anos e meio. De regresso a Lisboa, preocupou-se em reorganizar o seu atelier, não descurando o Fado. Voltou ao Brasil em 1926 e apresentou-se no Cinema Central do Rio de Janeiro.
Em 1931 integrou o elenco da opereta História do Fado, apresentada pela companhia Maria das Neves, no Teatro Maria Vitória, juntamente com Ercília Costa, Maria Alice, Maria Albertina e Alberto Costa. Ainda com esta companhia, desempenhou o papel de Cesária na opereta Mouraria, no Coliseu dos Recreios.
Fez várias parcerias com Alfredo Marceneiro (ver foto anexa)
Maria do Carmo fez parte de uma “troupe” cómica tauromáquica de nome Charlot, Max e D. José, com a qual cantou durante três anos em muitas das praças de toiros do país.
Embarcou novamente para o Brasil em 1934, como figura principal da Embaixada do Fado, que integrava nomes como o guitarrista Armando Freire (Armandinho) o violista Santos Moreira, Maria do Carmo Torres, Filipe Pinto e Joaquim Pimentel.
Formou o Grupo Artístico de Fados Maria do Carmo, que integrava Manuel Cascais, Cecília d´Almeida, José Marques e Armando Machado.
Alguns dos Fados do seu repertório mais conhecidos foram, Fado Maria do Carmo, Beijos Venenosos, sendo uma das suas criações o bonito poema de João Linhares Barbosa, “É Tão Bom Ser Pequenino”
É TÃO BOM SER PEQUENINO
Letra de: João Linhares Barbosa
Música: Fado Corrido
É tão bom ser pequenino,
Ter pai, ter mãe, ter avós,
Ter esp'rança no Destino
E ter quem goste de nós.
Vem cá, José Manuel!
Dás-me a graciosa ideia
De Jesus na Galileia
A traquinar no vergel.
És moreninho de pele
Como foi o Deus Menino.
Tens o mesmo olhar divino;
Ai que saudades eu tenho
Em não ser do teu tamanho!
É tão bom ser pequenino.
Os teus dedos delicados
Nas tuas mãos inquietas
Lembram-me dez borboletas
A voejar nos silvados.
Fui como tu, sem cuidados,
Também corri veloz;
Vem cá, falemos a sós
Do caso sentimental,
Que eu vou dizer-te o que vale
Ter pai, ter mãe, ter avós.
Ter avós, afirmo-to eu,
— Perdoa as imagens minhas
É ter relíquias velhinhas,
E ter mãe é ter o céu;
Ter pai, assim como o teu,
Que te dá o pão e o ensino,
É ter sempre o Sol a pino
E o luar com rouxinóis,
Triunfar como os heróis
Ter esp' rança no Destino.
Sabes o que é a esperança.
O sonho, a ilusão, a fé?
Sabes lá o que isso é
Minha inocente criança.
Tu és fonte na pujança
E o rio que chegou à foz;
Eu sou antes, tu após,
Ai que saudades, saudades,
A gente a fazer maldades
E ter quem goste de nós.