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Associação Cultural de Fado

"O Patriarca do Fado"
Sábado, 14 de Junho de 2014

SANTOS POPULARES - Arraiais e Marchas Populares

Lá vai Lisboa - canta Maria José Valério 

MARCHAS POPULARES - ORIGENS
 
As “Maias”, originaram as festas dos três Santos Populares, Santo António, S. João e S. Pedro.
Eram as “Maias” cantos litúrgicos dedicados no mês de Maio, à Virgem Maria, Porém, tendo-se adulterado o seu carácter religioso, com povo a fazer bailados  nas ruas das cidades, forma consideradas pagãs e assim, foram proibidas no século XIV, por ordem de El-Rei Dom João I. O povo que sempre gostou de cantar e bailar, passou todavia, a celebrar outra festa, oriunda da bênção dos primeiros frutos, em Quinta-Feira de Ascensão de Jesus Cristo: o “Dia da Espiga”, o povo vai aos campos para recolher, raminho de oliveira, rosmaninho, malmequer, papoila e trigo. Ainda hoje na «Quinta-Feira da Espiga»,  há esta tradição chegando a haver vendedores de rua a vender o “Raminho da Espiga” e que segundo a tradição é guardado em casa até ao ano seguinte.
Por meados do século XVIII,  os franceses durante o período napoleónico, iniciaram  a moda de dançar as marchas militares,  realizavam em Junho para celebrar a tomada da Bastilha a que chamavam “marche aux falambeaux ” em que o povo desfilava com uns archotes acesos na mão.
Este costume foi adoptado pelos portugueses que lhes passaram a chamar “Marcha ao flambó" (portanto adaptação do termo francês), só que nós os portugueses substituímos os «archotes revolucionários dos franceses» por "balões de papel" e "fogo de artificio", que  tinham sido costumes trazidos da China no século XVII, e que jà eram usados nos arraiais e feiras por todo o País, e assim  as antigas danças e cantares de "Maio à Virgem Maria"  que  entretanto tinham sido proibidas foram transpostas para o mês de Junho, passando a celebrar-se as festas dos «Santos Populares»,  “Santo António, São João e São  Pedro “.
Lisboa veste-se de cravos rubros que são esplendor em Junho festivo, de vasos com manjericos nas janelas, sendo costume colocar na copa do manjerico, um cravo encarnado com uma bandeirinha hasteada com uma quadra popular escrita.
 
Se eu fosse o cravo vermelho
Que trazes sobre o teu peito
Por muito que fosse velho
Não te guardava respeito
 
Cravo manjerico e vaso
E uma quadrinha singela
Tudo lhe dei... Não fez caso!...
Pronto! Não caso com ela
 
Ateia-se uma fogueira  para assar as sardinhas,  e os rapazes e raparigas saltam e bailam á sua volta até ao raiar do dia.
A alcachofra brava, também tem o seu simbolismo nestas festividades, quem queria saber se era correspondida/o no amor pelo namorado, devia chamuscar na fogueira, a alcachofra em flor, e se a mesma  passados alguns dias voltasse a florir, era sinal que o amor era sincero e daria em casamento.
Sobre o saltar à fogueira, houve também muita inspiração para versos mais “malandrecos”
 
Ou ela não usa calças
Ou as tem na lavadeira
Dei por isso ontem à noite
Quando saltava à fogueira
 
As Marchas têm um ritmo diferente do Fado: mais cadenciado, mais vivo e de métrica poética menos uniforme, sempre enriquecida pelo «estribilho» , o refrão no Fado, mas arcos, balões, cravos manjericos, alcachofras, fogueiras e danças não deixam de ser motivos de inspiração para os letristas de Fado.
Consulta: Fado- Mascarenhas Barreto

 

Amostra dos trajes dos Padrinhos das Marchas

 

 

 

Letra de: Silva Tavares

 

               OS SANTOS POPULARES

 

 

O mês de Junho é o coração do ano

que ora canta, ora sofre, ora perdoa.

Um coração que desde há muito irmano

ao coração do povo de Lisboa.

 

 

                           Que espanta, pois, que os dois se queiram bem?

                           O idílio nada tem de singular

                           e, assim que Junho lá vem,

                           lá vai Lisboa a cantar!

 

Canta nos mastros e festões que à toa

documentam a ingénua fantasia

da gente boa da Madragoa,

de Alfama, do Bairro Alto e Mouraria.

 

                          Canta no tom dolente e pedinchão

                          dos garotos do bairro - e quantos há,

                          Santo Deus! - que nos barram o caminho

                          de bandeja na mão:

                          — « meu senhor, dê cá um tostãozinho

                          p'ró Santo António! Meu Senhor... dê cá!»

 

Canta nas alcachofras que se queimam

e, depois de ficarem qual tição,

vão espetar-se na terra — a ver se teimam

em reflorir ou não!...

 

                        Canta em ingénuas tradições caseiras;

                        em mil superstições e mil caprichos: ´

                        — No verde manjerico, nas fogueiras,

                        nas cornetas de barro, nos cochichos!

 

Nas bichas de rabiar, entre o clamor

estouvanado da histérica donzela;

nas bombas que rebentam com fragor;

na luz viva do fósforo de cor

que se acende à janela!

 

                       No balão de papel, cheio de fumo,

                      que, verdadeira imagem da ilusão,

                      domina o espaço e sobe e vai, sem rumo,

                      até extinguir-se a chama — o coração!

 

Canta nos bailaricos do mercado,

e nas sinas compostas a granel,

e nos trilos do grilo encarcerado,

e nas quadras dos cravos de papel!...

 

                      Quando virdes passar festivos arcos

                      de que pendam balões, simbolizando

                      velhas fachadas, monumentos, barcos

                      — é Lisboa que passa e vai cantando!

 

Canta p'lo Santo António, p'1o São João

e p 'lo São Pedro, enfim, num testemunho

fervente do seu culto à tradição

e num último adeus ao mês de Junho!

 

                     Tão velho afecto será sempre novo,

                      enquanto aos dois restar sombra de alento:

                      — Se Junho é cem por cento o mês do povo,

                      Lisboa, em Junho, é, povo cem por cento!

 

 

 

 

Evocação da Marchas Populares de 1955

 

 

 

Grande Marcha de Lisboa 1955

 

LETRA DE; Silva Tavares  Música de: João Andrade Santos

 

É Lisboa! Venham vê-la !

São de sonho as graças que encerra!

Só Deus sabe se foi estrela

E baixou lá do Céu à terra

 

Pôs craveiros à janela;

No amor é leal, ardente.

A falar — não há voz mais bela !

A cantar — não há voz mais quente !

 

 ESTRIBILHO

 

Esta Lisboa bendita,

Feita cristã p'ra viver,

É a menina bonita

De quem tem olhos p'ra ver!

 

Moira sem alma nem lei,

Quis dar-lhe o céu cor e luz.

E o nosso primeiro rei,

Deu-lhe nova grei

E o sinal da cruz !

 

Nas airosas caravelas,

Tempo após, com génio profundo.

Cruz sangrando sobre as velas

—    Portugal dilatou o mundo !

—     

E a Lisboa ribeirinha.

Ao impor sua cruz na guerra,

Foi então a gentil rainha

Ante a qual se curvou a Terra.

 

 

Licença Creative Commons
Este trabalho está licenciado com uma Licença Creative Commons - Atribuição-NãoComercial-CompartilhaIgual 4.0 Internacional, assim como registo na Sociedade Portuguesa de Autores, sócio nº 125820, e Alfredo Marceneiro é registado como marca nacional no INIP, n.º 495150.
música: marchas Populares
Viva Lisboa: Lisboa amada
publicado por Vítor Marceneiro às 07:00
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Quarta-feira, 25 de Maio de 2011

Alfredo Marceneiro - Origens

Seus pais, Gertrudes da Conceição e Rodrigo Duarte, eram ambos naturais do Cadaval, descendentes de duas conhecidas famílias da região, os Coelho e os Duarte, mas gente humilde.

Amigos e companheiros de brincadeiras desde crianças atingiram a idade adolescente com a amizade transformada em amor. As perspectivas de futuro também nessa altura eram difíceis na aldeia, pelo que decidiram partir para Lisboa à procura de melhores condições de vida. Corria o ano de 1890. Gertrudes já trazia no seu ventre a semente do seu amor e mal chegam à capital casa com Rodrigo na Igreja de Santa Isabel, recebendo dos lábios do padre Santos Farinha a bênção matrimonial.

Rodrigo Duarte era mestre de corte de calçado, tendo arranjado colocação numa sapataria da Rua da Madalena e graças a esse salário consegue alugar uma pequena casa na freguesia de Santa Isabel, num prédio da Travessa de Santa Quitéria. Hoje já não existe: foi demolido para abertura da Avenida Álvares Cabral.

E foi nessa casa que nasceu para o mundo o primeiro filho do casal Duarte, no dia 29 de Fevereiro de 1888,, mas só foi possível registá-lo, por falta de posse, e foi asiim que lhe foi dado, na pia baptismal, o nome de ALFREDO RODRIGO DUARTE, pelo mesmo pároco que havia unido em casamento seus pais, mas três anos depois em 1891, como não era ano bissexto tiveram que adoptar a data de 25, e foi assim que nos registos oficiais consta que nasceu a 25 de Fevereiro de 1891.

Com o acréscimo de responsabilidades e um novo incentivo na sua vida, Rodrigo Duarte pensou em melhorar a sua situação económica e resolveu assim jogar a sua sorte estabelecendo-se por conta própria, com uma oficina de calçado na Rua de São Bento.

A vida decorreu normalmente para a família Duarte, que viu aumentar o seu lar com o nascimento de mais três filhos: o Júlio — que foi também fadista de nomeada —, o Álvaro e a Júlia, todos igualmente baptizados pelo bondoso padre Santos Farinha, na Igreja de Santa Isabel.

O pequeno Alfredo frequenta a escola primária, tendo desde cedo demonstrado uma especial aptidão para a leitura e gramática, repartindo a sua infância pelas brincadeiras no Jardim da Praça das Flores e ajudando seu pai na oficina, durante as férias escolares.

No carnaval quando as cegadas (representações teatrais populares) saíam para a rua, deliciava-se a ouvir os descantes e seguia alegremente as exibições dos actores de rua nas suas digressões pelo bairro, decorando os versos que ouvia. Chegado a casa, logo seus pais se transformavam em plateia, ouvindo com profundo deleite o génio do pequeno Alfredo.

O seu gosto pelo canto é influenciado por sua mãe que, nas descamisadas, nas romarias e nos bailaricos lá da terra, cantava que era uma delícia. No entanto, quer seu pai — que tinha pertencido à banda musical do Cadaval —, quer seu avô materno, José Coelho, transmitiram-lhe fortes influências, especialmente o segundo, que tocava guitarra e cantava fados de improviso.

Já homem feito, sempre que falava de sua mãe, recordava o seu cantar enquanto fazia a lide caseira. De entre os muitos versos populares que a ouvia entoar, um dos mais preferidos, rezava assim:

 

Nasci nas praias do Mar

Ás fúrias do vento irado

Tinha por berço, uma lancha

Por lençol, o Céu estrelado

 

Rodrigo Duarte apercebeu-se de que o seu pequeno Alfredo tinha intuição para a música e queria que o filho aprendesse os rudimentos musicais.

Infelizmente, não viveu o suficiente para ver satisfeitos os seus desejos, porquanto aos 38 anos de idade a morte o ceifou, arrancando-o brutalmente do convívio dos seus entes queridos.

Foi o padre Santos Farinha quem, apesar da avançada idade, integrou o cortejo, a pé (como era hábito na época), que acompanhou o corpo do desditoso Rodrigo Duarte à sua última morada, o cemitério dos Prazeres, revelando a grande amizade que nutria pela família Duarte.

Aquele sarcedote, que seguia de perto o desabrochar do pequeno Alfredo, chegou a sugerir a seus pais, o envio deste para o seminário, pois via no jovem grandes capacidades.

Decorria o ano de 1905 e o pequeno Alfredo, então com 13 anos, profundamente abalado pela perda do pai, viu-se forçado a abandonar os estudos para começar a ganhar a vida, ajudando assim sua mãe a criar os seus irmãos mais jovens. A ida para o seminário ficava também fora de hipótese.

Infelizmente não chegou a haver condições de ter ficado com uma foto do pai.

 

© Vítor Duarte Marceneiro in “Recordar Alfredo Marceneiro”

 

 

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